O comentário, enviado à BBC Brasil pela
secretaria com status de ministério, responde a um relatório divulgado
nesta sexta-feira pela ONU. O órgão mundial afirma que o racismo
"permeia todas as áreas da vida" no Brasil.
Tanto a ONU quanto o governo, entretanto, também destacam avanços nas políticas para afrodescendentes no Brasil.
Segundo o Planalto, a implementação de cotas
raciais na educação e no serviço público e a Política Nacional de Saúde
Integral da População Negra foram medidas importantes no processo de
reversão deste problema histórico no país.
A ONU concorda e diz que os principais avanços ocorreram durante o governo do ex-presidente Lula.
As críticas do relatório e o posterior "mea
culpa" são resultado da visita de um grupo de trabalho da ONU a
Brasília, Pernambuco, Bahia, São Paulo e Rio de Janeiro, em dezembro do
ano passado.
Os especialistas foram recebidos por representantes do governo, do judiciário e de organizações da sociedade civil.
Desigualdade
O texto do relatório informa que "o racismo
permeia todas as áreas da vida no país" e que é difícil para os negros
discutir o tema, já que "o país vive um mito de democracia racial".
Segundo a ONU, o desemprego é 50% maior entre
afrodescendentes e a média salarial dos brancos, por sua vez, é o dobro
do salário dos negros.
Enquanto a expectativa de vida entre os negros
não passa de 66 anos, a dos brancos é seis anos maior. Mais da metade
dos negros não tem saneamento básico adequado no país - a média chega a 3
em cada 10 brancos.
Crianças no complexo da Maré, no Rio de Janeiro |
As Nações Unidas reconhecem que o país conta com
"diversas instituições para a promoção da igualdade social" e "diversos
avanços expressivos foram feitos na legislação sobre a igualdade
racial", especialmente nos últimos dez anos.
"Os mecanismos de reprodução das desigualdades
raciais se atualizam no Brasil. O reconhecimento do papel estruturante
do racismo é o principal fator para que a atual gestão apoie
decididamente ações afirmativas para produzir as mudanças que, por longo
tempo, foram impedidas de acontecer na sociedade brasileira", disseram
os porta-vozes do governo à reportagem da BBC Brasil.
"Esses ganhos ainda são acompanhados pela
persistência das desigualdades raciais", afirma o governo federal.
Segundo o Planalto, as diferenças entre brancos e negros demandam "um
renovado esforço de articulação de iniciativas capazes de neutralizar
seus efeitos deletérios sobre as oportunidades de inclusão que se abrem
no Brasil de hoje".
"É um processo", diz a pasta.
'Ideologia de embranquecimento'
Entre os resultados da pesquisa, a ONU aponta
que a educação é uma das principais áreas de discriminação e uma das
principais fontes de desigualdade. "É importante que se desconstrua a
ideologia de embranquecimento que continua a afetar uma parcela
significante da sociedade", diz a ONU.
Segundo o órgão internacional, "políticos
conservadores desvalorizam ações afirmativas, políticas e leis"
direcionadas aos afrodescendentes - que têm menos acesso à saúde e
educação, menor expectativa de vida, menos cargos públicos e maior
presença nas prisões.
O relatório critica as administrações estaduais e
municipais, onde "faltam recursos materiais e financeiros para que as
atividades possam ser conduzidas".
O órgão ainda destaca o trabalho de redução do
racismo institucional em Pernambuco, com trabalhos de sensibilização e
capacitação de policiais, e um grupo de trabalho contra o racismo criado
pelo Ministério Público pernambucano.
Segundo o órgão internacional, o foco nos
policiais é "importante para transformar a cultura de violência sob
pretexto de segurança nacional" - três negros morreram em cada quatro
homicídios cometidos no Brasil em 2010.
Justiça
A dificuldade de acesso à justiça pela população negra é, para a ONU, um dos pontos-chave da discussão.
Segundo o órgão, como a sociedade ainda nega a
existência de praticas racistas, estas questões acabam não chegando no
judiciário e, quando chegam, dificilmente são penalizadas. As Nações
Unidas indicam ainda que a polícia atua com critérios "baseados na cor
da pele" dos cidadãos.
"O papel da polícia é garantir a segurança
pública", diz o relatório. "Mas o racismo institucional, a discriminação
e a cultura de violência levam a práticas de tortura, chantagem,
extorsão e humilhação, em especial contra afro-brasileiros."
Ainda segundo o documento, "o direito à vida sem violência não é garantido pelo Estado".
Nenhum comentário:
Postar um comentário