Parte II da Conferência teológica preparada pelo Prof. Isaltino Gomes Coelho Filho para a Faculdade Teológica Batista de Campinas, 14 de abril de 2004.
Observemos, agora, um pouco, as pregações neopentecostais pela televisão. Uma das maiores ênfases está nas maldições que devem ser quebradas. Há também a ênfase em cristãos que ficam possessos. Absurdamente, o demônio saiu da periferia e migrou para o centro do culto neopentecostal. Repito o que disse anteriormente, e não por falta de argumento, mas para fixá-lo bem, porque isto é fundamental. Temos um contra-senso: um Cristo fraco e demônios fortes. Cristo salva, mas é incapaz de encher a vida da pessoa. Cristo recebeu um nome sobre todo o nome, mas não consegue impedir a ação de Satanás na vida de uma pessoa. Cristo tem todo poder, mas nada pode ser feito por ele na vida do crente, a não ser que o pastor neopentecostal autorize. Um desses pregadores, irado com algumas pessoas que dele discordavam, dizia pela televisão que não adiantava que lhe citassem versículos bíblicos dizendo que o crente não fica endemoninhado, porque ele via, na sua experiência diária, que eles ficam endemoninhados. Aparentemente fujo da questão cristológica, mas volto a ela. O abandono do eixo hermenêutico como sendo as Escrituras produz mais uma aberração: a experiência humana interpreta as Escrituras nesta afirmação, quando o certo é que a Bíblia interprete nossa experiência. Nossos sentidos não podem ser o padrão para interpretar a Bíblia. Exemplifico com algo simples. Sou daltônico. Um daltônico não é um deficiente, apenas tem um sentido visual diferente de uma pessoa não daltônica. Tem dificuldades em distinguir determinadas cores e certos tons, mas vê com mais nitidez formas e contrastes. O não daltônico é iludido pelo mimetismo, o fenômeno do camaleão. O daltônico não o é. As fardas camufladas, tanques camuflados, a camuflagem, em geral, como a do camaleão, do calango e do bicho pau, não o iludem. Isto mostra que os sentidos não são absolutos. “Eu senti no meu coração”, brada o neopentecostal. Pronto, não se pode discutir com ele. Mas Jeremias 17.9 o refuta: “O coração é mais enganoso que qualquer outra coisa e sua doença é incurável. Quem é capaz de compreendê-lo?” (NVI). Não é que nós sentimos em nosso coração. É o que a Bíblia diz. Se sentirmos de uma maneira e a Bíblia disser de outra, nós é que estamos errados, e não a Bíblia.
Nossa fonte de informação sobre a pessoa de Cristo precisa ser a Bíblia. E esta precisa de um referencial seguro em sua interpretação. Na citação deste pregador televisivo, ficamos com uma situação singular. Se Cristo não pode evitar, com sua presença na vida de uma pessoa, que o demônio tenha poder sobre ela, de que nos serve tal Cristo? Para que serve um Cristo que precisa ser reforçado pela oração forte de um guru, caso contrário não pode produzir efeito na vida do fiel? Que Cristo é este? Uma triste caricatura do Cristo mostrado nos evangelhos.
Copeland, outro líder neopentecostal, em um de seus sermões, põe esta palavra na boca de Jesus:
"Não se perturbe quando o desprezarem e falarem dura e severamente contra você. Eles falaram dessa maneira contra você. Eles falaram dessa maneira comigo, e não deveriam falar com você? Eles me crucificaram por ter reivindicado ser Deus. Mas eu não reivindiquei ser Deus; apenas disse que andava com Ele e que Ele estava em mim. Aleluia!" [8]
Vê-se que a divindade de Jesus é claramente negada por Copeland. Hanegraaff faz esta observação: “Os mestres da Fé parecem ver Cristo pouco mais que um irmão mais velho...”. [9] E está certo. Eles pouco precisam do Cristo autoritativo, porque eles têm um relacionamento direito com Deus, falam com ele o tempo todo. Aliás, Hagin e Hinn, entre outros, dizem que eles são da mesma natureza de Jesus, e que nós também o somos. As vezes em que assim se expressam são tantas que os remeto ao livro de Hanegraaff citado nesta palestra para comprovarem. Hagin tem tanta liberdade espiritual, que num só dia, segundo ele mesmo, visitou o inferno por três vezes [10]. Como gosta do inferno! O trágico em tudo isto, é que estas pessoas não precisam de um mediador e de um de sacerdote, como nós precisamos e vemos as duas figuras na pessoa de Jesus. Muitas delas se vêem como mediadores entre Deus e os homens. Elas prescindem de Cristo. Elas se declaram como Cristo. Sua filiação a Deus é no nível de Cristo. Algumas delas se dizem iguais a Cristo.
Este problema cristológico surge porque muitos pastores neopentecostais disputam espaço com Jesus. A anteriormente citada megalomania chega aqui ao seu nível extremo. Os crentes antigos oravam assim pelo pregador: “Esconde o teu servo atrás da cruz de Cristo”. Bonita oração, mas parece que foi trocada por outra: “Esconde a cruz de Cristo atrás de teu servo”. Vemos muito de um Cristo descorado e de pregadores brilhantes. É estranho isto. Tenham cuidado com o pregador que aparece mais que Jesus.
O pastor deve pregar a obra de Jesus, mas o pastor neopentecostal completa a obra de Jesus. Ele, só ele, tem poder de quebrar maldições, só ele possui a oração forte, só ele tem poder sobre o demônio. Ele é um sacerdote. Cristo não é Sumo Sacerdote, mas apenas um ente espiritual. Na realidade, o Sumo Sacerdote é o pastor neopentecostal. Vê-se isso em igrejas do pentecostalismo autônomo. A pessoa abre uma igreja, dá-lhe um nome exótico, e começa seu trabalho. Mas quem o legitima? Quem o credencia? A legitimação e credenciamento surgem no momento em que um demônio se manifesta e ele o repreende e o vence. A partir deste momento em que venceu o demônio, ele está reconhecido como pastor e sua igreja reconhecida como autêntica. O credenciamento e a legitimação de um pastor e de uma igreja devem vir da centralidade de Jesus em sua vida. Isto nos lembra 1João 3.8: “... Para isso o Filho de Deus se manifestou: para destruir as obras do Diabo”. Jesus destruiu o poder do Maligno. Por causa da obra de Jesus, que derrotou o Maligno e nos abriu o caminho para o céu, temos o Espírito Santo. E diz 1João 4.4: “Filhinhos, vocês são de Deus e os venceram, porque aquele que está em vocês é maior do que aquele que está no mundo” (NVI). O Espírito Santo que Jesus nos enviou da parte do Pai é maior do que Satanás. Se ele está em nós, nossa vida está cheia do Espírito. É Jesus quem quebra o poder do Maligno, não a oração de alguém.
Devem ter notado, e devem se recordar que já comentei isto, que muito da pregação neopentecostal televisiva é calcada no Antigo Testamento. O pregador se refugia no Antigo Testamento, porque ali se sente mais seguro. O Novo Testamento, por causa da obra de Jesus, socializa os dons. Jesus deus dons à igreja, diz Efésios 4. O Antigo Testamento elitiza os dons. Eles são para pessoas especiais, uma elite, uma casta. A cristologia neopentecostal é fraca porque muito de suas pregações são veterotestamentárias, sem o fio de prumo interpretativo do Novo. Então, a pessoa de Jesus deixa de reger a Revelação, ele, que nos dizer dos teólogos reformadores, é o “cânon dentro do cânon”, e passa a ser um taumaturgo comandado pelo pastor.
Esta questão é crucial para o futuro do movimento evangélico. Temos muitas igrejas ditas evangélicas e muita gente dita evangélica. Vou parafrasear Paulo, quando disse que não é judeu quem o é exteriormente, mas sim que o é interiormente. O verdadeiro evangélico é aquele que tem uma experiência de conversão a Jesus, que foi perdoado por ele, tem certeza de sua salvação por ele, espera sua segunda vinda e tem certeza de morar para sempre com ele no céu. É aquele que crê que Jesus é Senhor. E é esta questão do senhorio deve ser real e não retórica. Ser Senhor não é ser padroeiro. No neopentecostalismo, parece que Jesus é apenas uma entidade padroeira. “Jesus é o Senhor desta cidade” é uma placa que se vê em algumas localidades por este Brasil. Confunde-se Senhor com padroeiro. “O mundo todo está debaixo do poder do Maligno”, diz 1João 5.19. O senhor das cidades humanas é Satanás. A cidade onde Jesus será Senhor de direito e de fato é a Nova Jerusalém, que virá do céu para nossa habitação. Ele é Senhor dos que crêem nele, dos que o obedecem. De direito e de fato. Do mundo, ele é Senhor de direito, mas o Maligno usurpa porque domina os incrédulos. Mas ao voltar, Jesus esmagará o mal em definitivo. É a tensão entre o já e o ainda não. Cito agora, sobre esta questão, um trecho de minha dissertação de mestrado:
Jesus Cristo já inaugurou o reino de Deus, mas este ainda não se consumou. O mundo por vir, com sua transformação escatológica, já teve suas bases lançadas, mas ainda não chegou. Já somos filhos de Deus, temos bênçãos indescritíveis para nós reservadas, mas elas ainda não se manifestaram em sua totalidade porque ainda não entramos na plena liberdade dos filhos de Deus. Satanás já foi vencido, porque Jesus entrou em seus domínios e o amarrou, libertando-nos do seu poder e domínio, mas ainda não foi subjugado por completo. Pelo contrário, “O vosso adversário, o Diabo, anda em derredor, rugindo como leão, e procurando a quem possa tragar” (1Pe 5.8).
Quando se enfatiza em demasia o ainda não, entramos num processo de derrota, de frustração, numa falta de perspectiva para o futuro. Pregar apenas o ainda não traz desânimo e transforma a fé cristã em algo distante. Produz até mesmo uma sensação de derrota. O derrotismo é incompatível com o caráter cristão.
Quando se enfatiza em demasia o já, entramos numa situação de triunfalismo infantil, de ingenuidade espiritual e de desconhecimento da realidade. Pensa-se que a perfeição já chegou, que o céu já foi trazido para a terra. Passa-se a viver em nível de artificialidade espiritual e de irrealidade teológica. Vê-se isto no triunfalismo moral, que ensina a impecabilidade do crente. Vê-se, no caso da teologia da prosperidade, que ensina o triunfalismo físico, a saúde perfeita e completa e a riqueza material. Que mostra uma vida de triunfo sobre todas as adversidades, em todos os momentos [11].
Nós vivemos no ainda não, cremos no já e esperamos por ele. O arroubo neopentecostal quer o já agora. Cristo já derrotou Satanás na cruz, mas o mundo ainda jaz no maligno. Ele já nos libertou do poder das trevas, mas ainda pecamos. Já provamos os poderes celestiais, mas ainda vivemos neste mundo. O senhorio de Jesus já foi proclamado, mas ele ainda não submeteu tudo a seus pés. Lemos em 1Coríntios 15.24-26: “Então virá o fim, quando ele entregar o Reino a Deus, o Pai, depois de ter destruído todo domínio, autoridade e poder. Pois é necessário que ele reine até que todos os seus inimigos sejam postos debaixo de seus pés. O último inimigo a ser destruído é a morte”. A cristologia mostra que o mundo se submeterá a Cristo no final dos tempos. Cuidado com o arroubo retórico e grandiloqüente.
Mas eis a pergunta que não quer calar, a verdadeira pergunta que não quer calar: “Quem é Jesus Cristo?”. Para um cristão, a linguagem sobre a Divindade e sobre Jesus, o Filho, será sempre respeitosa. Eis uma declaração da mídia secular, analisando a linguagem neopentecostal sobre Deus e Jesus, ao falar da Igreja Renascer:
A igreja ostenta como membro de maior audiência a bispa Sonia Hernandes, 40 anos, mulher de Estevam. Sonia notabilizou-se ao cunhar frases como "Deus é uma coisa muito quentinha e gostosinha", ou "Jesus era um cara muito pirado, não morreu, apenas deu um tempo" [12].
Deus não é uma coisa. Jesus não era pirado nem deu um tempo. Morreu, foi sepultado, ressuscitou e voltará em poder e glória. A propósito, quero citar a Declaração Doutrinária da Convenção Batista Brasileira, no item “Deus Filho”. Eis o que os batistas crêem sobre Jesus e que endosso in totum:
Jesus Cristo, um em essência com o Pai, é o eterno Filho de Deus. N’Ele, por Ele e para Ele, foram criadas todas as coisas. Na plenitude dos tempos Ele se fez carne, na pessoa real e histórica de Jesus Cristo, gerado pelo Espírito Santo e nascido de Virgem Maria, sendo em sua pessoa verdadeiro Deus e verdadeiro homem. Jesus é a imagem expressa do seu Pai, a revelação suprema de Deus ao homem. Ele honrou e cumpriu plenamente a lei divina e obedeceu a toda a vontade de Deus. Identificou-se perfeitamente com os homens, sofrendo o castigo e expiando as culpas de nossos pecados, conquanto Ele mesmo não tivesse pecado. Para salvar-nos do pecado morreu na cruz, foi sepultado e ao terceiro dia ressurgiu dentre os mortos e, depois de aparecer muitas vezes a seus discípulos, ascendeu aos céus, onde, à destra do Pai, exerce o seu eterno Supremo Sacerdócio. Jesus Cristo é o Único Mediador entre Deus e os homens e o Único suficiente Salvador e Senhor. Pelo seu Espírito Ele está presente e habita no coração de cada crente e na Igreja. Ele voltará visivelmente a este mundo em grande poder e glória, para julgar os homens e consumar sua obra redentora.
Pregação e ensino que deslustrem ou minimizem a pessoa de Jesus são enganos diabólicos. É obra do Diabo colocar Jesus em outro lugar que não seja o primeiro, em sua própria Igreja. Jesus é mais que um nome místico, mais que uma senha, mais que um slogan, mais que um curandeiro. É Deus feito homem. Uma cristologia que não reconheça isto nem proclame em alto e bom som seu senhorio sobre o mundo e o veja apenas como um nome a manipular, não é cristologia. É um desserviço ao evangelho. E é esta a cristologia neopentecostal.
Nossa fonte de informação sobre a pessoa de Cristo precisa ser a Bíblia. E esta precisa de um referencial seguro em sua interpretação. Na citação deste pregador televisivo, ficamos com uma situação singular. Se Cristo não pode evitar, com sua presença na vida de uma pessoa, que o demônio tenha poder sobre ela, de que nos serve tal Cristo? Para que serve um Cristo que precisa ser reforçado pela oração forte de um guru, caso contrário não pode produzir efeito na vida do fiel? Que Cristo é este? Uma triste caricatura do Cristo mostrado nos evangelhos.
Copeland, outro líder neopentecostal, em um de seus sermões, põe esta palavra na boca de Jesus:
"Não se perturbe quando o desprezarem e falarem dura e severamente contra você. Eles falaram dessa maneira contra você. Eles falaram dessa maneira comigo, e não deveriam falar com você? Eles me crucificaram por ter reivindicado ser Deus. Mas eu não reivindiquei ser Deus; apenas disse que andava com Ele e que Ele estava em mim. Aleluia!" [8]
Vê-se que a divindade de Jesus é claramente negada por Copeland. Hanegraaff faz esta observação: “Os mestres da Fé parecem ver Cristo pouco mais que um irmão mais velho...”. [9] E está certo. Eles pouco precisam do Cristo autoritativo, porque eles têm um relacionamento direito com Deus, falam com ele o tempo todo. Aliás, Hagin e Hinn, entre outros, dizem que eles são da mesma natureza de Jesus, e que nós também o somos. As vezes em que assim se expressam são tantas que os remeto ao livro de Hanegraaff citado nesta palestra para comprovarem. Hagin tem tanta liberdade espiritual, que num só dia, segundo ele mesmo, visitou o inferno por três vezes [10]. Como gosta do inferno! O trágico em tudo isto, é que estas pessoas não precisam de um mediador e de um de sacerdote, como nós precisamos e vemos as duas figuras na pessoa de Jesus. Muitas delas se vêem como mediadores entre Deus e os homens. Elas prescindem de Cristo. Elas se declaram como Cristo. Sua filiação a Deus é no nível de Cristo. Algumas delas se dizem iguais a Cristo.
Este problema cristológico surge porque muitos pastores neopentecostais disputam espaço com Jesus. A anteriormente citada megalomania chega aqui ao seu nível extremo. Os crentes antigos oravam assim pelo pregador: “Esconde o teu servo atrás da cruz de Cristo”. Bonita oração, mas parece que foi trocada por outra: “Esconde a cruz de Cristo atrás de teu servo”. Vemos muito de um Cristo descorado e de pregadores brilhantes. É estranho isto. Tenham cuidado com o pregador que aparece mais que Jesus.
O pastor deve pregar a obra de Jesus, mas o pastor neopentecostal completa a obra de Jesus. Ele, só ele, tem poder de quebrar maldições, só ele possui a oração forte, só ele tem poder sobre o demônio. Ele é um sacerdote. Cristo não é Sumo Sacerdote, mas apenas um ente espiritual. Na realidade, o Sumo Sacerdote é o pastor neopentecostal. Vê-se isso em igrejas do pentecostalismo autônomo. A pessoa abre uma igreja, dá-lhe um nome exótico, e começa seu trabalho. Mas quem o legitima? Quem o credencia? A legitimação e credenciamento surgem no momento em que um demônio se manifesta e ele o repreende e o vence. A partir deste momento em que venceu o demônio, ele está reconhecido como pastor e sua igreja reconhecida como autêntica. O credenciamento e a legitimação de um pastor e de uma igreja devem vir da centralidade de Jesus em sua vida. Isto nos lembra 1João 3.8: “... Para isso o Filho de Deus se manifestou: para destruir as obras do Diabo”. Jesus destruiu o poder do Maligno. Por causa da obra de Jesus, que derrotou o Maligno e nos abriu o caminho para o céu, temos o Espírito Santo. E diz 1João 4.4: “Filhinhos, vocês são de Deus e os venceram, porque aquele que está em vocês é maior do que aquele que está no mundo” (NVI). O Espírito Santo que Jesus nos enviou da parte do Pai é maior do que Satanás. Se ele está em nós, nossa vida está cheia do Espírito. É Jesus quem quebra o poder do Maligno, não a oração de alguém.
Devem ter notado, e devem se recordar que já comentei isto, que muito da pregação neopentecostal televisiva é calcada no Antigo Testamento. O pregador se refugia no Antigo Testamento, porque ali se sente mais seguro. O Novo Testamento, por causa da obra de Jesus, socializa os dons. Jesus deus dons à igreja, diz Efésios 4. O Antigo Testamento elitiza os dons. Eles são para pessoas especiais, uma elite, uma casta. A cristologia neopentecostal é fraca porque muito de suas pregações são veterotestamentárias, sem o fio de prumo interpretativo do Novo. Então, a pessoa de Jesus deixa de reger a Revelação, ele, que nos dizer dos teólogos reformadores, é o “cânon dentro do cânon”, e passa a ser um taumaturgo comandado pelo pastor.
Esta questão é crucial para o futuro do movimento evangélico. Temos muitas igrejas ditas evangélicas e muita gente dita evangélica. Vou parafrasear Paulo, quando disse que não é judeu quem o é exteriormente, mas sim que o é interiormente. O verdadeiro evangélico é aquele que tem uma experiência de conversão a Jesus, que foi perdoado por ele, tem certeza de sua salvação por ele, espera sua segunda vinda e tem certeza de morar para sempre com ele no céu. É aquele que crê que Jesus é Senhor. E é esta questão do senhorio deve ser real e não retórica. Ser Senhor não é ser padroeiro. No neopentecostalismo, parece que Jesus é apenas uma entidade padroeira. “Jesus é o Senhor desta cidade” é uma placa que se vê em algumas localidades por este Brasil. Confunde-se Senhor com padroeiro. “O mundo todo está debaixo do poder do Maligno”, diz 1João 5.19. O senhor das cidades humanas é Satanás. A cidade onde Jesus será Senhor de direito e de fato é a Nova Jerusalém, que virá do céu para nossa habitação. Ele é Senhor dos que crêem nele, dos que o obedecem. De direito e de fato. Do mundo, ele é Senhor de direito, mas o Maligno usurpa porque domina os incrédulos. Mas ao voltar, Jesus esmagará o mal em definitivo. É a tensão entre o já e o ainda não. Cito agora, sobre esta questão, um trecho de minha dissertação de mestrado:
Jesus Cristo já inaugurou o reino de Deus, mas este ainda não se consumou. O mundo por vir, com sua transformação escatológica, já teve suas bases lançadas, mas ainda não chegou. Já somos filhos de Deus, temos bênçãos indescritíveis para nós reservadas, mas elas ainda não se manifestaram em sua totalidade porque ainda não entramos na plena liberdade dos filhos de Deus. Satanás já foi vencido, porque Jesus entrou em seus domínios e o amarrou, libertando-nos do seu poder e domínio, mas ainda não foi subjugado por completo. Pelo contrário, “O vosso adversário, o Diabo, anda em derredor, rugindo como leão, e procurando a quem possa tragar” (1Pe 5.8).
Quando se enfatiza em demasia o ainda não, entramos num processo de derrota, de frustração, numa falta de perspectiva para o futuro. Pregar apenas o ainda não traz desânimo e transforma a fé cristã em algo distante. Produz até mesmo uma sensação de derrota. O derrotismo é incompatível com o caráter cristão.
Quando se enfatiza em demasia o já, entramos numa situação de triunfalismo infantil, de ingenuidade espiritual e de desconhecimento da realidade. Pensa-se que a perfeição já chegou, que o céu já foi trazido para a terra. Passa-se a viver em nível de artificialidade espiritual e de irrealidade teológica. Vê-se isto no triunfalismo moral, que ensina a impecabilidade do crente. Vê-se, no caso da teologia da prosperidade, que ensina o triunfalismo físico, a saúde perfeita e completa e a riqueza material. Que mostra uma vida de triunfo sobre todas as adversidades, em todos os momentos [11].
Nós vivemos no ainda não, cremos no já e esperamos por ele. O arroubo neopentecostal quer o já agora. Cristo já derrotou Satanás na cruz, mas o mundo ainda jaz no maligno. Ele já nos libertou do poder das trevas, mas ainda pecamos. Já provamos os poderes celestiais, mas ainda vivemos neste mundo. O senhorio de Jesus já foi proclamado, mas ele ainda não submeteu tudo a seus pés. Lemos em 1Coríntios 15.24-26: “Então virá o fim, quando ele entregar o Reino a Deus, o Pai, depois de ter destruído todo domínio, autoridade e poder. Pois é necessário que ele reine até que todos os seus inimigos sejam postos debaixo de seus pés. O último inimigo a ser destruído é a morte”. A cristologia mostra que o mundo se submeterá a Cristo no final dos tempos. Cuidado com o arroubo retórico e grandiloqüente.
Mas eis a pergunta que não quer calar, a verdadeira pergunta que não quer calar: “Quem é Jesus Cristo?”. Para um cristão, a linguagem sobre a Divindade e sobre Jesus, o Filho, será sempre respeitosa. Eis uma declaração da mídia secular, analisando a linguagem neopentecostal sobre Deus e Jesus, ao falar da Igreja Renascer:
A igreja ostenta como membro de maior audiência a bispa Sonia Hernandes, 40 anos, mulher de Estevam. Sonia notabilizou-se ao cunhar frases como "Deus é uma coisa muito quentinha e gostosinha", ou "Jesus era um cara muito pirado, não morreu, apenas deu um tempo" [12].
Deus não é uma coisa. Jesus não era pirado nem deu um tempo. Morreu, foi sepultado, ressuscitou e voltará em poder e glória. A propósito, quero citar a Declaração Doutrinária da Convenção Batista Brasileira, no item “Deus Filho”. Eis o que os batistas crêem sobre Jesus e que endosso in totum:
Jesus Cristo, um em essência com o Pai, é o eterno Filho de Deus. N’Ele, por Ele e para Ele, foram criadas todas as coisas. Na plenitude dos tempos Ele se fez carne, na pessoa real e histórica de Jesus Cristo, gerado pelo Espírito Santo e nascido de Virgem Maria, sendo em sua pessoa verdadeiro Deus e verdadeiro homem. Jesus é a imagem expressa do seu Pai, a revelação suprema de Deus ao homem. Ele honrou e cumpriu plenamente a lei divina e obedeceu a toda a vontade de Deus. Identificou-se perfeitamente com os homens, sofrendo o castigo e expiando as culpas de nossos pecados, conquanto Ele mesmo não tivesse pecado. Para salvar-nos do pecado morreu na cruz, foi sepultado e ao terceiro dia ressurgiu dentre os mortos e, depois de aparecer muitas vezes a seus discípulos, ascendeu aos céus, onde, à destra do Pai, exerce o seu eterno Supremo Sacerdócio. Jesus Cristo é o Único Mediador entre Deus e os homens e o Único suficiente Salvador e Senhor. Pelo seu Espírito Ele está presente e habita no coração de cada crente e na Igreja. Ele voltará visivelmente a este mundo em grande poder e glória, para julgar os homens e consumar sua obra redentora.
Pregação e ensino que deslustrem ou minimizem a pessoa de Jesus são enganos diabólicos. É obra do Diabo colocar Jesus em outro lugar que não seja o primeiro, em sua própria Igreja. Jesus é mais que um nome místico, mais que uma senha, mais que um slogan, mais que um curandeiro. É Deus feito homem. Uma cristologia que não reconheça isto nem proclame em alto e bom som seu senhorio sobre o mundo e o veja apenas como um nome a manipular, não é cristologia. É um desserviço ao evangelho. E é esta a cristologia neopentecostal.
NOTAS
______________
[8] Conforme HANEGRAAFF, Hank. Cristianismo em Crise. Rio de Janeiro: Casa Publicadora das Assembléias de Deus, 1996, p. 149.
[9] Ib., ibidem, p. 150.
[10] HAGIN, Kenneth. O Extraordinário Crescimento da Fé. Rio de Janeiro: Graça Editorial, s/d, p.38-40
[11] COELHO FILHO, Isaltino. Os Sofrimentos do Messias e Sua Aplicação Para Nosso Tempo – Uma Avaliação da Teologia da Prosperidade, dissertação de mestrado, não publicada, p. 122
[12] Artigo “Deus está no ar”, de Débora Crivellaro, recebido pela Internet, sem mais dados.
[9] Ib., ibidem, p. 150.
[10] HAGIN, Kenneth. O Extraordinário Crescimento da Fé. Rio de Janeiro: Graça Editorial, s/d, p.38-40
[11] COELHO FILHO, Isaltino. Os Sofrimentos do Messias e Sua Aplicação Para Nosso Tempo – Uma Avaliação da Teologia da Prosperidade, dissertação de mestrado, não publicada, p. 122
[12] Artigo “Deus está no ar”, de Débora Crivellaro, recebido pela Internet, sem mais dados.
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